Kinectimals e a marcha fúnebre dos controles de movimento
Existem jogos que, apesar de não serem exatamente obra-primas, se encaixam como peças fundamentais no grande quebra-cabeças da história dos videogames. Produções que retratam bem o contexto específico de uma época, muitas vezes até melhor do que algum vencedor de premiações de melhores do ano.
Com o extremamente bem sucedido lançamento do Wii, em 2006, a indústria presenciou no decorrer dos anos seguintes uma febre de jogos com controles de movimento. A maioria desses jogos tentava emular a estratégia da Nintendo de visar públicos mais amplos, longe do arquétipo do “gamer” convencional.
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A moda se espalhou também para os consoles concorrentes, PlayStation 3 e Xbox 360. O problema é que Sony e Microsoft não conseguiram antecipar essa tendência, e tiveram que improvisar com periféricos que não faziam parte do kit de desenvolvimento padrão das plataformas.
Foi desse caldeirão que surgiu Kinectimals, um a resposta da Microsoft e do Xbox para uma pergunta que absolutamente ninguém tinha feito.
Do que se trata
Desenvolvido pela Frontier Developments e publicado pela própria Microsoft em novembro de 2010, Kinectimals é exatamente o que o nome anuncia: um jogo para Kinect, o sensor de movimentos do Xbox, envolvendo animais silvestres.
Além de ser fruto da onda de controles de movimento, Kinectimals foi inspirado também por Nintendogs, simulador de bichinhos de estimação que fez bastante sucesso no Nintendo DS em 2005. Notem que até o nome do jogo vem do mesmo conceito de aglutinar duas palavras diferentes.
O que você faz no jogo
A exemplo do que acontecia em Nintendogs, a ideia aqui é interagir com diversos animais em uma ilha paradisíaca intocada pela civilização humana. Porém, enquanto no DS as interações com os cachorrinhos se davam pela caneta na tela de toque, aqui contamos apenas com o sensor de movimentos do Kinect, que não depende de nenhum controle específico.
O resultado da proposta é deixar uma pessoa no meio da sala balançando os braços no vazio, fingindo de modo meio desengonçado que está tentando acariciar um tigre selvagem – o que, aliás, não parece uma ideia das mais prudentes. O jogo utiliza também comandos de voz para várias atividades diferentes como, por exemplo, ordenar que uma pantera se finja de morta.
Uma ideia particularmente desastrada de Kinectimals está em ilustrar no jogo a tela da televisão, mais ou menos como acontece em Metroid Prime com o capacete da Samus. Assim, se um animal chegar muito perto, o “vidro” da TV fica embaçado com o hálito quente, por exemplo.
Isso reforça a ideia de que nenhum contato real está sendo estabelecido, e pior, passa a impressão de que o coitado do bicho está preso em um monitor de LED implorando por migalhas de afeto.
Cabe uma menção honrosa aqui ao Bumble, uma espécie de híbrido de fada com lêmure falante que funciona como anfitrião da ilha. Um personagem particularmente irritante para qualquer pessoa que tenha mais de 8 anos de idade.
O impacto estético
Kinectimals protagonizou um dos momentos mais peculiares da E3 2010, o que é um feito considerável, lembrando que esse foi o ano no qual a conferência da Konami se transformou em uma fábrica inesgotável de memes. Durante a apresentação do jogo de Kinect, uma garotinha interagiu com um tigre brincalhão no palco. A cena durou pouco mais de dois minutos, mas passou como uma eternidade para todas as pessoas presentes.
Logo descobriríamos que aquela era a marcha fúnebre da febre de controles de movimento. Kinectimals ajuda a fechar as cortinas de uma onda que saturou o mercado com uma enxurrada de produções medíocres visando lucro fácil.
Não se ouve mais falar em Kinect pelos corredores da Microsoft, exceto talvez por sussurros receosos de algum funcionário em horário de almoço. A ideia de interagir com animais selvagens em uma ilha gerenciada por um insuportável lêmure mágico voador parece um delírio coletivo que o Phil Spencer adoraria apagar dos livros de história.
Felizmente, Kinectimals existe para deixar tudo isso muito bem documentado.