A trama de Pikmin pode parecer simples, mas esconde detalhes bem densos
Assim como outras séries famosas da Nintendo, Pikmin tem uma premissa simples que visa abranger um público infantojuvenil, mas com várias camadas de profundidade, que escondem detalhes mais profundos e, às vezes, até macabros. Os jogos possuem sinopses e missões bem objetivas, que não exigem muito tempo e esforço de quem quer só curtir um lazer, comandando criaturinhas fofas. No entanto, quem escolher se aprofundar no universo apresentado terá conteúdo o bastante para tirar conclusões bem mais densas e inesperadas.
Este resumo da história da série servirá como guia para quem pretende começar a jogar pelo lançamento mais recente, Pikmin 4. Mas também funciona como uma recapitulação para a galera que já terminou os outros três jogos, ou que tenha pulado algum. Estou considerando apenas os três primeiros jogos da série principal, sem incluir o spin-off de 3DS, Hey! Pikmin, e o aplicativo para celular, Pikmin Bloom, por acreditar que eles acrescentam muito pouco ao contexto geral da trama.
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Pikmin: o diário de bordo do capitão Olimar
O principal protagonista da série é o capitão Olimar, um explorador espacial, nascido no planeta Hocotate, que viaja pelas galáxias a bordo da nave S.S. Dolphin. O estopim da história toda é um acidente envolvendo um asteroide em uma das viagens, que obriga o pequeno astronauta a fazer um pouso forçado em um planeta desconhecido, que posteriormente ficará conhecido como PNF-404.
A Dolphin foi extremamente danificada durante a queda, com várias partes da nave caindo em pontos diferentes do planeta. Olimar tem a dura missão de recuperar todas as peças perdidas em um prazo de 30 dias, que corresponde ao tempo que lhe resta com oxigênio disponível para sobreviver na atmosfera local. A tarefa seria impossível sem a ajuda dos Pikmin, pequenos seres que brotam do solo e, cultivados por Olimar, passam a compor um exército disposto a obedecer fielmente às ordens do capitão.
O jogo possui três variações de final dependendo da quantidade de peças da nave recuperadas. A conclusão canônica para a continuidade da história é a melhor possível, na qual Olimar consegue restaurar a S.S. Dolphin por completo e se despede – temporariamente – dos Pikmin, para retornar ao planeta Hocotate.
Pikmin 2: Louie e o segredo por trás da dívida
A trama de Pikmin 2 gira em torno de uma enorme dívida. Ao retornar ao planeta natal, Olimar descobre que a empresa para a qual trabalha, a Hocotate Freight, está no negativo, após perder um enorme carregamento de comida. Mais precisamente, de cenouras douradas Pikpik. O prejuízo foi tamanho que obrigou o presidente da companhia a penhorar inúmeros itens, incluindo a nave S.S. Dolphin.
A solução encontrada por Olimar para essa crise foi voltar ao planeta PNF-404 ao lado de Louie, um funcionário novato da empresa. Uma vez lá, a dupla recorre mais uma vez à ajuda dos Pikmin para reunir tesouros raros. O valor das relíquias coletadas – que vão desde tampas de garrafa até pilhas Duracell – será capaz de quitar a dívida, salvar a empresa e, consequentemente, impedir que Olimar perca a nave de estimação.
Com os tesouros reunidos, Olimar se despede mais uma vez do inóspito planeta, descobrindo apenas no meio do caminho que havia deixado Louie para trás. Na missão final do jogo, o capitão volta ao planeta, na companhia do presidente da empresa, para resgatar o suposto amigo perdido.
Digo “suposto” porque, concluindo a aventura, desbloqueamos uma informação secreta que muda tudo: o carregamento de cenouras douradas, na verdade, tinha sido devorado pelo próprio Louie. O jogo deixa no ar se o personagem é apenas atrapalhado e imprudente, ou deliberadamente malvado, mas várias linhas de texto dão a entender que Louie é, na verdade, um traidor dissimulado.
Pikmin 3: a grande crise de Koppai
O planeta Koppai enfrenta uma crise sem precedentes devido ao aumento populacional e a falta de recursos e alimentos para todos. Eles enviam algumas naves exploradoras não tripuladas ao espaço, chamadas SPEROs, sonhando em encontrar algum planeta que possa servir como nova fonte de suprimentos. O planeta encontrado, pasmem, é o PNF-404. Três exploradores são enviados para lá: Alph, um jovem engenheiro, Brittany, uma botânica, e Charlie, o capitão da nave S.S. Drake. Na órbita do planeta, o trio também é atingido por um asteroide que separa o time em um pouso forçado
Os três logo encontram os Pikmin e aprendem a usá-los, em um esforço colaborativo para reunir suprimentos e reparar a nave. Durante a tarefa, descobrem também que Olimar e Louie estão de volta ao planeta PNF-404 para sanar uma nova dívida. Porém, Olimar se tornou prisioneiro de uma estranha entidade conhecida como Plasm Wraith. O trio de Koppai resgata o capitão e foge do planeta a bordo da S.S. Drake com os alimentos necessários para salvar o planeta em crise.
O planeta PNF-404 e a origem dos acidentes
Não é preciso ser nenhum gênio da semiótica para perceber que o planeta dos Pikmin, batizado de PNF-404 pelos viajantes, é, na verdade, a Terra. Embora o texto do jogo nunca afirme isso diretamente, não faltam rastros de presença humana ali, especialmente nos vários itens que remetem diretamente à nossa cultura e a produtos consumidos na vida moderna em sociedade. O que não encontramos, porém, são pessoas de fato. Apenas restos jogados. A fauna local em nada lembra os animais que conhecemos no mundo real também.
A teoria mais aceita é que Pikmin se passa em um mundo pós-apocalíptico, centenas ou milhares de anos após a extinção da humanidade. O motivo do apocalipse? Aparentemente, alguma catástrofe envolvendo energia nuclear. Essa hipótese é corroborada por um item encontrado no primeiro jogo, o Geiger Counter.
Olimar afirma, nos próprios diários, que desconhece o propósito do dispositivo, alegando apenas que se trata de um detector que, às vezes, começa a apitar loucamente. Contadores Geiger, porém, existem de verdade no nosso mundo e servem justamente para pedir altos níveis de radiação. O desastre nuclear ajudaria a explicar também a estranha fauna de PNF-404, com animais que lembram apenas vagamente aqueles que conhecemos no mundo real. Os inimigos de Pikmin parecem mais quimeras, seres híbridos, que surgiram da fusão de espécies distintas.
Um último ponto que vale ser destacado sobre a mitologia da série está na figura do “vilão” dos jogos. O ser conhecido como Plasm Wraith, que surge no terceiro jogo, na verdade, não tem forma física definida. É uma espécie de energia ou entidade que parece ter uma fixação bizarra no capitão Olimar. Fãs japoneses logo perceberam que a entidade parece ter sido inspirada na popular lenda japonesa do “Umibozu”, um demônio que vive no oceano e é responsável pelo naufrágio de embarcações. Conta-se que esse ser se apossa dos capitães dos navios, caso sinta que foi desrespeitado por eles. Percebem onde quero chegar?
Se o ser sem forma física encontrado nos jogos de Pikmin for uma versão intergalática do Umibozu, todas as quedas de nave da série envolvendo colisões com asteroides nunca foram, na verdade, acidentes. Tudo fazia parte dos desígnios dessa entidade que, cada vez mais, parece obcecada com a ideia de prender o capitão Olimar para sempre.
Talvez Pikmin 4 corrobore todas essas teorias, ou traga novos elementos para enriquecer ainda mais a intrigante mitologia da série. O que fica é a sensação de que Pikmin, além de apresentar personagens carismáticos e aventuras envolventes, também recompensa os fãs que decidem mergulhar um pouco mais fundo na história aparentemente simples que os jogos propõem.
Para saber mais sobre as origens da série e outras referências que corroboram esse ar mais misterioso e sombrio, não deixe de conferir a análise detalhada da última entrevista com os criadores da série.