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Starfield e a falsa sensação de solidão

Starfield e a falsa sensação de solidão

Starfield promete uma experiência de exploração solitária, mas não sabe evocar o básico do sentimento A nova aventura da Bethesda, Starfield, prega que a exploração espacial é algo solitário, e por isso, muitos dos planetas que o jogador encontra não possuem vida. No entanto, a desenvolvedora parece ter errado a mão na hora de tentar passar esse sentimento.

Igor Pontes •
05/09/2023 às 21h00, atualizado há um ano
Tempo de leitura: 9 minutos

Starfield promete uma experiência de exploração solitária, mas não sabe evocar o básico do sentimento

A nova aventura da Bethesda, Starfield, prega que a exploração espacial é algo solitário, e por isso, muitos dos planetas que o jogador encontra não possuem vida. No entanto, a desenvolvedora parece ter errado a mão na hora de tentar passar esse sentimento.

Com tantos bons exemplos de títulos que retratam a solidão de forma mais assertiva, resolvemos elaborar um pouco sobre como o RPG da Bethesda tenta trazer o sentimento de desolação e solitude, mas falha ao não construir direito a premissa.

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A solidão nos jogos

Solidão, pela definição do dicionário, é um “estado de quem se acha ou se sente desacompanhado ou só; isolamento.” Ou “a sensação ou situação de quem vive afastado do mundo em meio a um grupo social”. Alguns jogos conseguem evocar esse sentimento em quem está jogando, enquanto outros, falham em entender o conceito.

Existem algumas obras que captam muito bem o sentimento de solidão, e inclusive, permitem ao jogador entender o motivo por trás disso, experimentando, também, o outro lado da moeda. Journey é um ótimo exemplo de como a solidão pode ser uma excelente ferramenta para contar uma história, e tornar os momentos compartilhados com outras pessoas ainda mais potentes. 

Journey entrega uma aula de solidão através da trilha sonora, da construção das fases, na história. No protagonista que não fala, em um mundo deserto com apenas alguns personagens aparecendo esporadicamente, ajudando a atenuar o vazio que faz parte da premissa do jogo.

Gris, é um jogo sobre luto, e também solidão. Nesse caso, a solidão está presente na jornada da protagonista, no design das fases, no estilo de direção, na forma como aborda o tema de um jeito introspectivo, sem precisar mostrar diretamente para o jogador do que se trata. O luto vivido pela garota de cabelo azul, a solidão do caminho, estão ali, sem precisar de nenhum reforço a mais.

A solidão em Starfield

A própria Bethesda, com a franquia Fallout, conseguia trazer esse sentimento de solidão ao caminhar pelos Estados Unidos devastado pela radiação. Até mesmo Skyrim, se o jogador quiser, dá para torná-lo uma experiência solitária se deixar os companheiros de lado.

Perdi as horas de quantas vezes fiquei andando pelo mapa de Fallout 3 ouvindo as músicas no rádio, matando mutantes, tudo isso, em uma terra desolada, vazia e solitária. O mundo do RPG apocalíptico da Bethesda não é vazio, nem de longe, mas evocava o sentimento através da música, das construções abandonadas e do contexto geral da obra.

Starfield e a solidão completa

A solidão nos jogos se destaca através da construção feita pela equipe para evocar esse sentimento, e não é somente colocar o jogador em um cenário vazio e torcer para que ele se sinta só. É necessária uma contextualização maior, um trabalho mais complexo.

Por isso, Starfield parece se escorar no vazio da exploração espacial para justificar a falta de conteúdo em alguns planetas. E mesmo que o sentimento de solidão seja subjetivo, o “vazio” dos corpos celestes do jogo não capta esse conceito da forma correta.

Como Breath of the Wild é o exemplo perfeito para Starfield

Se formos falar sobre um título que entendeu e soube como trazer a solidão, foi The Legend of Zelda: Breath of the Wild. E aqui, esse sentimento de estar só é apoiado em diversos motivos da trama, que transformam cada passeio a cavalo de Link em uma jornada contemplativa para quem está no controle.

The Legend of Zelda Breath of the Wild

Em Breath of the Wild, Link perdeu tudo. As memórias, os companheiros, a pessoa quem ele jurava defender e o mundo. Cem anos se passaram desde a maior falha do herói ao tentar deter a calamidade, e o título faz questão de lembrar isso ao jogador.

Construções destruídas, locais desertos, poucos NPCs por aí, com raros momentos nos quais Link encontra um comerciante ou um viajante precisando de ajuda, o salva, e segue a jornada, mais uma vez, sozinho.

Breath of the Wild faz um trabalho de colocar o jogador para revisitar Hyrule decadente, aos pedaços. O principal lembrete da falha do plano de Zelda para tentar parar Calamity Ganon, dos campeões mortos, de tudo o que Link perdeu ao falhar e deixar o mundo a mercê do mal.

Starfield e a solidão completa

As planícies de Hyrule em Breath of the Wild, não são vazias, mas são solitárias. Link cavalga pelo horizonte com um piano tocando ao fundo, passa pelos destroços de Lon Lon Ranch e continua a viajar.

Ir atrás das memórias, também faz parte desse conceito, principalmente por colocar o jogador para entender o quanto Link perdeu 100 anos atrás, e buscar o sentimento de “nostalgia” ao mergulhar no passado em busca de respostas.

Essa construção, da série de coisas colocadas no jogo para trazer esse sentimento de introspecção, é o que realmente garante que quem está controlando o personagem se conectará com a proposta oferecida.

O jogador nunca está realmente sozinho em Starfield

Algo que me pegou um pouco nessa ideia de querer deixar o jogador com esse sentimento, é que não existe uma construção para isso. O protagonista passa o tempo todo com a nave cheia, com vários personagens carismáticos — um grande acerto de Starfield, aliás — e isso não colabora para aterrissar no planeta e sentir a solidão.

A solidão em Starfield

Apesar do companheiro que acompanha o protagonista não falar muito durante a exploração, ele está ali. Existe alguém com o protagonista, uma pessoa com quem está desbravando essa terra inóspita, e o principal, compartilhando isso com o parceiro.

É lógico, é possível chegar e dispensar o companheiro, mas, existe uma equipe na nave do jogador. Membros da tripulação que sempre vão conversar contigo, ter uma piadinha, mantendo a Frontier “viva” enquanto viaja por aí.

Dessa forma, fica difícil de explorar o universo e sentir a tal “solidão” da exploração espacial, quando existe uma trupe de parceiros para te fazer companhia enquanto viaja para os pontos mais distantes da galáxia.

O pequeno e pálido ponto azul

A “bela desolação” de Starfield parece mais um playground sem ter com o que brincar. A proposta de tentar evocar o sentimento de introspecção e solidão não acontece, muito porque os planetas são vazios, não solitários.

Starfield

Entrar em um local vazio não significa que você vá se sentir só, afinal de contas, uma pessoa pode estar em um local cheio e se sentir dessa forma. É a construção que torna o sentimento acessível para o jogador, e Starfield não tenta trabalhar isso, ou pelo menos, passa essa impressão.

Os planetas são bonitos? Sim, são bonitos, não posso negar. A exploração de Starfield tem, como ponto forte, a imensidão dos planetas e como o jogador pode andar por aí e desbravar os lugares. Mas não é solitário ou introspectivo.

Existe, sim, um mérito em tornar o mapa dos planetas vazios. Para permitir a exploração e os jogadores se tornarem os pioneiros ao aterrissar em um desses locais. No entanto, Starfield falha em tentar criar um sentimento de solidão, muito por não construir essa sensação com outros elementos que não só um mapa em branco.

E está tudo bem não ter esse sentimento de solidão em Starfield, o problema é ter prometido uma coisa e entregar outra.


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