Pikmin 4 flerta com outros gêneros para tornar a série mais acessível
No dia 19 de julho, uma quarta-feira nublada, eu tive a oportunidade de participar, a convite da Nintendo Brasil, de um evento comemorativo para o lançamento de Pikmin 4. O encontro, realizado na Avenida Paulista, coração da capital de São Paulo, reuniu jornalistas e criadores de conteúdo para testar o jogo, levar brindes exclusivos e, claro, comer alguns petiscos na conta do Miyamoto.
Durante cerca de 2 horas, pude presenciar um pouco da recepção inicial da mídia especializada com o jogo. Havia cerca de 8 televisores disponíveis para testes, e, como o número de convidados não era tão numeroso, não foi estabelecido exatamente um limite de tempo para cada pessoa. A organização confiou, acertadamente, no bom senso e cordialidade entre os presentes.
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Foi dessa forma que constatei algo que me surpreendeu: raramente alguém largava o controle enquanto não fosse solicitado. Houve inclusive o caso de um rapaz que saiu de uma das TVs apenas para sentar em outra que ficou vaga em seguida. Qualquer pessoa minimamente perspicaz perceberia que algo especial estava sendo conquistado ali, se a recepção vista ali fosse próxima da sensação geral do público após o lançamento.
Tudo isso está alinhado com a aposta feita pela Nintendo neste jogo. Pikmin 4 é a chance que a série tem de furar a própria bolha e atingir um público mais amplo. É notável o foco nesse objetivo, na publicidade massiva – um evento prévio de lançamento no Brasil é algo bastante raro – tentando apresentar o universo de Pikmin para jogadores que nunca tiveram contato com a série, a despeito do número 4 no título.
Agora, com o jogo final em mãos, pude analisar com mais calma como essa missão de tornar a série mais abrangente foi abordada, do ponto de vista do game design. Minhas primeiras horas com Pikmin 4 vieram acompanhadas de percepções e reflexões nesse sentido. Quero destacar aqui, principalmente, a mudança de câmera, a inclusão do Otchin e a notável fusão da proposta da série com o gênero de plataforma.
A câmera: uma nova visão para a série
Desde os primeiros teasers, a mudança mais perceptível, de imediato, foi o novo ângulo de câmera padrão do jogo. O ponto de vista, agora, está muito mais próximo do chão, algo bem distinto da visão de cima dos três títulos anteriores. Isso traz uma perspectiva mais próxima da dos personagens principais, mudando totalmente a noção de escala das coisas. Os exploradores e Pikmin são bem pequenos, do tamanho de insetos, e é mais fácil manter isso em mente pela nova angulação.
Este aspecto foi abordado por Yuji Kando, diretor do jogo, em uma entrevista recente. “Ao definir o ângulo da câmera próximo ao nível do solo, você olhará para cima, para os objetos no ambiente, e verá as coisas do ponto de vista de um Pikmin em vez de um humano”, disse ele. “Queríamos enfatizar o quão pequenos os Pikmin são, mostrando como o mundo se apresenta para eles”, concluiu o diretor. Essa ideia é bem exemplificada no vídeo abaixo.
Mas, além de dar uma noção diferente de escala e aumentar a imersão, o novo ângulo de câmera funciona também para tornar a experiência um pouco mais próxima de algumas das séries mais famosas da Nintendo, como Mario, Zelda e Splatoon. Não que esses jogos sejam parecidos entre si ou que Pikmin busque inspiração neles. É apenas mais familiar para o público médio, ter o ponto de vista do personagem que está sendo controlado. O que nos leva a outro fator importante: o distanciamento do gênero RTS para assimilar elementos de plataforma.
Além da estratégia: flertando como novos gêneros
Pikmin é a interpretação da Nintendo para um gênero que sempre fez muito sucesso no ocidente, especialmente em jogos para PC: a estratégia em tempo real (ou RTS, de “real time strategy”). Esse tipo de jogo foi popularizado por séries como Age of Empires, Starcraft e Command & Conquer. Costuma envolver gerenciamento de tropas e recursos em combates e guerras. Vem dos RTS o ângulo de câmera habitual dos três primeiros jogos de Pikmin, com a visão de cima.
Pikmin, desde o primeiro jogo, sempre foi excelente em apresentar uma abordagem mais simples e acessível do gênero para novos públicos. No entanto, isso nunca foi o bastante para fazer a série emplacar fora do próprio nicho. O quarto jogo flerta com outros gêneros e brinca mais com as possibilidades de exploração, movimentação e combate para ganhar uma roupagem um pouco mais distante das principais referências.
Um fator crucial nessa direção foi a inclusão do salvacão – amo a cretinice desse nome – Otchin. O minúsculo cãozinho dinamiza os combates, facilita a exploração e locomoção e ainda adiciona uma mecânica que nunca existiu antes na série: o pulo. Montado em um salvacão, o personagem principal agora pode arriscar saltos e planejar ataques em investida mirando pontos fracos dos inimigos.
Inúmeros outros ajustes de qualidade de vida e otimização foram implementados para melhorar o ritmo das missões e suavizar alguns desafios do jogo, mais uma vez, mirando novos jogadores. A julgar pela minhas primeiras impressões e pela recepção inicial da crítica, as mudanças seguiram um caminho bastante acertado que, mais do que tornar a série mais acessível, realmente melhoram a experiência toda, inclusive para fãs de longa data.
Quero compartilhar uma análise mais completa de outros aspectos do jogo, como as missões noturnas e batalhas Dandori, quando já tiver concluído a campanha principal. Por hora, o que vale ressaltar é que Pikmin 4 transforma e amplia as possibilidades da série de uma maneira realmente surpreendente. Esse jogo faz por Pikmin o que Metal Gear Solid 3: Snake Eater fez por Metal Gear.
Não sei se essa comparação fará sentido para muitas pessoas, mas quem entender saberá que isso é muito, muito positivo.