Sobre a dor e a delícia de resolver conflitos com uma partida de futebol
O mundo nunca mais foi o mesmo desde que o mercado publicitário percebeu que colocar a cara de uma pessoa famosa para anunciar um produto é algo que vende. Por exemplo, você pode chamar o Pelé, recém aposentado em 1978, para anunciar o videogame Atari.
“Larguei o futebol para jogar Atari”, diz o nosso eterno rei. Pouco importa se isso é verdade ou não. Também não parece importante saber se o Pelé poderia ser considerado uma referência quando o assunto é videogame. “Ele é tricampeão do mundo, fez gol em final de Copa aos 17 anos de idade, então merece o benefício da dúvida”, pensaria um consumidor hipotético impactado por essa propaganda no final dos anos 70.
Mas, e se a figura famosa usada pra vender for um personagem de videogame? E se for Mega Man, um dos mais importantes ícones da era 8-Bit, dando a cara pra vender um jogo de futebol? Um personagem que nos trouxe tantas alegrias não se arriscaria em outro gênero se não fosse pra render mais um jogo fantástico, certo?
“Errado”, responde Mega Man’s Soccer, que foi lançado para o Super Nintendo em 1994 – não coincidentemente o ano do tetra.
Do que se trata
Uma coisa que ninguém pode dizer é que Mega Man’s Soccer não foi honesto no seu título. Ele promete um jogo de futebol com o Mega Man e é exatamente isso que ele entrega. Objetivo, sem fazer rodeios, certeiro.
Na história, Mega Man, Roll e seu pai/criador Dr. Light estão curtindo um futebol de domingo à tarde na TV, quando de repente vários robôs tomam o campo. São antigos inimigos, criações restauradas do maligno Dr. Willy, e estão dominando estádios de futebol ao redor do mundo.
Para lidar com a emergência, Dr. Light modifica o Mega Man para que ele possa derrotar os robôs dentro do próprio jogo (?), vencendo-os em partidas de futebol e mantendo assim acesa a chama do espírito esportivo aos olhos do mundo. 🔥
O que você faz no jogo
Mais uma vez a objetividade precisa ser elogiada. O jogo consiste mesmo em jogar futebol com personagens de Mega Man.
São quatro modos de jogo, entre partidas rápidas, modo história, torneio e liga. Na campanha principal, chamada Capcom Championship, Mega Man precisa derrotar 8 times antes de poder encarar o Dr. Willy, contando até com uma tela de seleção idêntica à vista nos jogos da série principal.
É possível escolher formações e definir os personagens de acordo com a faixa de campo que irão ocupar. Assim temos personagens mais defensivos, que se saem melhor no gol ou na zaga, e aqueles com mais poder de fogo pra resolver lá na frente. Assim, além das 4 posições, temos também quarto atributos para cada boneco, que determinam sua eficácia em corrida, chute, dividida e defesa.
Mas tudo isso vai pro espaço se você tiver caminho livre para soltar um chute especial, que pode render gol de praticamente qualquer área do campo (já viu o Kojiro chutando em Super Campeões?). A dura realidade é que se ninguém tiver especial pra usar, todo o resto da partida fica parecendo uma briga de foice no escuro na qual é impraticável indentificar um padrão para driblar adversários ou para vencer o goleiro.
Sem dúvida as partidas rendem umas risadas se você for uma criança dos anos 90 com, 2 controles de Super Nintendo, competindo com o seu primo mala. Mas colocar Mega Man’s Soccer lado a lado com outros jogos de futebol do seu tempo, como International Superstar Soccer, o deixaria e uma posição um tanto embaraçosa.
O impacto estético
Conta-se que no Natal de 1914, soldados alemães e britânicos fizeram uma trégua nas trincheiras da 1ª Guerra Mundial para confraternizar e viver um pouco do espírito natalino em meio ao horror do conflito. A trégua é historicamente lembrada pela partida de futebol que rolou entre os soldados ainda uniformizados.
Nessa mesma linha, Mega Man’s Soccer imagina um mundo onde as tensões bélicas e os potenciais conflitos armados são substituídos por partidas de futebol, resolvendo nossas diferenças pela magia do esporte sem que ninguém precise sair ferido – exceto quando um chute especial atravessa sua cabeça e despedaça todo seu corpo, mas, detalhe.
Além da bela mensagem, o jogo parece ter deixado um legado em uma das suas mecânicas principais: o chute especial. Ainda hoje podemos ver jogos de esporte com personagens famosos testando os limites do esporte com seus poderes. O exemplo mais recente é o de Mario Strikers: Battle League, lançado para o Nintendo Switch em 2022.
Nos vemos na semana que vem com mais uma pérola da décima arte!
