Lies of P foi extremamente eficaz em me deixar com vontade de jogar Bloodborne
No começo de 2015, pude participar de um evento de lançamento de Bloodborne, realizado em uma livraria de São Paulo. Os jornalistas presentes tiveram a oportunidade de jogar Bloodborne pela primeira vez, em um ambiente todo decorado com base na estética do jogo. Nunca me recuperei totalmente do impacto daquela primeira experiência.
Bloodborne era diferente de tudo que eu já tinha jogado, ainda que as comparações com Dark Souls, também da FromSoftware, fossem inevitáveis. O combate mais ágil recompensava a agressividade. A ambientação inspirada na arquitetura gótica da era vitoriana, combinada com o conceito de caçadores de demônios, em um mundo permeado por entidades transcendentais, criou uma experiência sem par nos videogames.
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Aquela foi a primeira vez também que a FromSoftware pegou a estrutura da série Souls e transportou para outra estética distinta da fantasia medieval – algo que também seria repetido em 2019, com Sekiro. Essa versatilidade reforçou, no imaginário popular, a ideia de que os jogos da empresa estavam criando um gênero novo, o chamado “soulslike”, que logo serviria de inspiração para inúmeros títulos de outros estúdios.
Esse contexto nos traz até setembro de 2023, quando Lies of P está sendo lançado, disponível desde o primeiro momento para assinantes do Game Pass. Nos últimos dias, parei para conhecer o jogo, completar a introdução, e o sentimento que a experiência me trouxe foi ambíguo, no mínimo.
Já adianto que não me proponho, neste texto, a fazer uma análise detalhada sobre Lies of P, nem cravar se o jogo é bom ou não. Como comentei, joguei apenas a introdução. Mas esse primeiro contato, em vez de me instigar a me aprofundar cada vez mais no jogo, só fez despertar em mim uma saudade enorme de Bloodborne.
Em nenhum momento a desenvolvedora de Lies of P, Round8 Studios, tentou disfarçar as óbvias inspirações que o jogo carrega do trabalho da FromSoftware, especialmente Bloodborne. A ambientação, a paleta de cores, o mapeamento dos botões, as interfaces e notificações, tudo transmite aquela energia de “copia, só não faz igual”.
As inúmeras semelhanças me remeteram ao conceito de vale da estranheza (uncanny valley, no inglês). Essa é uma hipótese oriunda do campo da robótica que argumenta que quando réplicas de seres humanos são muito parecidas com pessoas de verdade, mas não idênticas, acabam por nos causar repulsa. A estranheza, no caso, viria do contato com essa imitação incompleta, que é muito similar a algo, mas não chega lá de fato.
Fiquei me perguntando se pode existir algo como um vale da estranheza para imitações de games. Porque, de certa forma, foi isso que eu senti jogando Lies of P. Parece muito Bloodborne, toda a roupagem está ali, emulada com uma atenção admirável, mas não é tão refinado, e, obviamente, jamais seria tão inovador e impactante quanto.
As coisas que mais gostei em Lies of P vieram da minha memória afetiva em relação à experiência de Bloodborne. É como ver a versão “live-action” de O Rei Leão e ficar empolgado não pelo filme em si, mas pelas lembranças que ele evoca dos bons momentos com o desenho original.
Talvez, em pontos mais avançados de Lies of P, o jogo se liberte dessa inspiração para brilhar por méritos próprios. Como falei, ainda não posso avaliar essa progressão. Mas acho válido questionar onde fica traçada a linha que separa inspiração, homenagem e cópia. Em que momento o gênero soulslike pode virar um mero escudo para empresas se aproveitarem das ideias da FromSoftware sem ter muito a acrescentar?
Lies of P se esforça o máximo que pode para ser um novo Bloodborne, e justamente por isso parece ser incapaz de cumprir o objetivo. Porque Bloodborne apenas é.